A enorme solidão do lance-livre...

Fui novamente desafiado a escrever sobre um tema que preocupa um amigo treinador de formação: o enorme desconforto que alguns atletas exibem no momento de executar um lance-livre em contexto de jogo. Excelentes lançadores de campo que têm percentagens fracas da linha de LL, prejudicando assim o desempenho da sua equipa.
Em primeiro lugar, as razões para este comportamento podem ser de origem variada, desde a dificuldade em simular o contexto de jogo nos treinos, passando pela técnica ainda pouco apurada, terminando no problema mais comum quando enfrentamos cenários mais desconfortáveis: a ansiedade.
Debruçando-me um pouco sobre o meu trabalho – o controlo da ansiedade – é um facto que ela surge com os “pensamentos futuros”, normalmente sob a forma de questões internas do tipo: “e se eu falhar? e se a equipa perder por um? e se o treinador me tira? e se…?”. Este descontrolo emocional tem a sua solução no Treino Mental mas, se deixado progredir livremente, transforma-se rapidamente em nervosismo, medo de falhar, tensão muscular e, porque o lançamento no basquetebol é um exercício de relaxamento, num lance-livre falhado.
Apesar do enorme desafio emocional que é a marcação de um lance-livre, os mais jovens devem sentir-se bafejados pela sorte e pela evolução do jogo. Quando eu era juvenil (hoje sub16) sempre que uma equipa atingia o seu limite de faltas a equipa adversária tinha duas opções: 1+1 ou posse de bola. Como?! Era assim: se a equipa estivesse a vencer por muitos escolhia posse de bola e a bola era reposta na linha lateral com novo tempo total de ataque; se a equipa estivesse a perder escolhia a opção 1+1 lances livres. Mas 1+1 não são 2?!?! O basquetebol dantes provava-nos que nem sempre! Só tinha direito a lançar o segundo quem marcasse o primeiro. Ou seja, uma forma inteligente de premiar o mérito que quem possuía maior controlo emocional. Desses tempos recordo-me de um Beira Mar vs Esgueira que terminou os 40 minutos com o Esgueira na frente por um ponto mas com uma falta, sem ser em acto de lançamento, sobre um jogador do Beira Mar. Pavilhão sobrelotado e ao rubro. Jogador aurinegro dirige-se para o 1+1 já sem tempo no cronómetro. Conseguem imaginar a pressão de poder só dispor de um lance livre e perder o jogo imediatamente caso falhasse? Marcou o primeiro! Jogo empatado e direito ao segundo lance-livre! Ruído ensurdecedor. Marcou o segundo! Jogo ganho com “nervos de aço” e com a admiração eterna do catraio que viu, aprendeu e hoje escreve estas linhas. O nome deste herói de nervos de aço? Fernando Catarino. Um Senhor!
Todos nós possuímos um sistema emocional aberto que reage a estímulos conforme os entende como ameaças ou oportunidades e que tem o poder de contagiar quem nos rodeia. Esta reacção emocional por parte dum atleta que vai executar um lance-livre é perfeitamente legítima. A linha de lance-livre pode ser um local duma enorme solidão! Senão, vejamos: o jogo pára, o tempo pára e, de repente, sou só eu com uma bola e um cesto pela frente... E os adversários, o árbitro, o público, o treinador… No fundo, é o mais parecido que há no basquetebol com um desporto individual. Muito semelhante, ao nível emocional, com o que acontece a um futebolista que se prepara para bater uma grande penalidade. Em ambos os casos, esta é uma oportunidade única dentro dum desporto colectivo para se ser egoísta e, simultaneamente, ajudar a equipa!
A agravar o cenário, normalmente o lance-livre acontece depois duma falta, que pode ser dura e deixar marcas, o que faz com que tenha que ser executado em condições físicas adversas.
Durante todo o meu percurso como atleta sempre fui fraco da linha de lance-livre até, já tarde nesse caminho, “espreitar” o mundo do Treino Mental e perceber que facilmente podia enganar o meu cérebro e conseguir enormes melhorias do meu rendimento. No final até cheguei a passar pelo bom “lancelivrador” que sempre quis ser mas nunca tinha conseguido. Tudo graças ao Treino Mental que agora partilho convosco com o objectivo de vos poupar o tempo que demorei a “chegar lá”…
Para demonstrar o quanto o Treino Mental pode ser importante, termino com a famosa “Experiência dos Lances Livres”. Num estudo acerca dos efeitos do treino mental no desempenho desportivo, uma turma de estudantes universitários foi dividida em três grupos. No início da experiência todos os alunos foram testados e foi registada a sua percentagem de eficácia da linha de lance livre. Nos 20 dias seguintes, o Grupo 1 treinou 20 minutos por dia. O Grupo 2 foi o grupo de controlo e não fez qualquer tipo de treino nesses 20 dias. Ao Grupo 3 foi pedido que lançassem lances livres “imaginários” durante 20 minutos por dia, nesses mesmos 20 dias. A este grupo não foi permitido qualquer treino com bola. No final da experiência, os alunos foram novamente testados e os resultados foram surpreendentes para a data (1960). O grupo de controlo teve igual desempenho ao que tinha tido na sessão inicial. O Grupo 1, que treinou os 20 minutos por dia teve um aumento na percentagem de 24%. O Grupo 3, que usou apenas Treino Mental, subiu a sua percentagem em 23%! Por outras palavras, o grupo que usou apenas Treino Mental teve resultados semelhantes aos do grupo que treinou com bola! Incrível, não?!
A melhor notícia é que todas as nossas experiências imaginadas podem ser bem sucedidas, o que pode sempre transformar as imagens negativas que temos em imagens positivas.
Sabe mais em www.mudaoteujogo.com

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